🌿 Conflitos entre Usucapião Rural e Preservação Ambiental
- Mariella F. Maccari de Camargo

- 14 de abr.
- 3 min de leitura
🌱 Quando o direito à terra esbarra na proteção da natureza
Imagine um produtor rural que vive há mais de 5 anos em uma propriedade sem escritura. Ele planta, cuida, sustenta sua família e cumpre seu papel produtivo. Na teoria, ele teria direito ao usucapião rural.
Mas agora imagine que parte da terra está dentro de uma Área de Preservação Permanente (APP), ou possui vegetação nativa protegida por lei.⠀E aí surge a dúvida: é possível conquistar o direito à propriedade em áreas ambientalmente protegidas?A resposta passa por um delicado equilíbrio entre direito agrário e direito ambiental — dois pilares fundamentais, mas que nem sempre andam em harmonia no campo.
📚 Entendendo o usucapião rural
O usucapião especial rural é um direito constitucional (art. 191 da CF/88) que permite a um trabalhador rural adquirir a propriedade de até 50 hectares de terra quando:
Exerce posse pacífica e contínua há 5 anos;
Produz de forma sustentável;
Não possui outro imóvel urbano ou rural.
Esse instrumento busca regularizar quem vive e produz, mas não tem título formal de propriedade.
🌳 Onde entra a preservação ambiental?
No campo, a terra não é apenas solo produtivo — ela também pode abrigar:
APPs (áreas de nascentes, encostas, margens de rios);
Reserva Legal (percentual mínimo de vegetação nativa);
Terras com vegetação nativa protegida por lei federal ou estadual.
Essas áreas são regidas pelo Código Florestal (Lei 12.651/2012), que impõe restrições severas de uso e impede a ocupação, desmatamento ou construção.
O conflito nasce quando parte da terra usucapida coincide com áreas protegidas.
⚖️ O que dizem os tribunais?
A jurisprudência brasileira tem entendido que não é possível adquirir, por usucapião, áreas localizadas dentro de APPs ou de uso restrito, mesmo que a posse cumpra os requisitos legais.
📌 STJ – REsp 1.075.960/SP
“O usucapião não pode recair sobre área de preservação permanente, ainda que ocupada por tempo superior ao exigido.”
Isso significa que, mesmo com posse mansa e produtiva, a preservação ambiental prevalece sobre o direito à aquisição da terra nessas áreas específicas.
❗ E se a área for parcialmente protegida?
É comum que a propriedade envolva uma parte ambientalmente protegida e outra não.
Nesse caso, o juiz pode:
Excluir a APP da área usucapida;
Determinar a averbação da APP como restrição no registro da matrícula;
Exigir recomposição ambiental das áreas degradadas.
Ou seja, o usucapião pode até ser concedido, mas com condicionantes ambientais.
🧠 Insight jurídico
“A posse por si só não gera direito sobre a natureza. Usucapião é um direito social, mas a preservação ambiental é um dever coletivo.”
🧾 Documentos e cuidados essenciais
Para quem busca regularizar a posse de terra com possível sobreposição ambiental, é essencial:
Ter o Cadastro Ambiental Rural (CAR) atualizado
Solicitar um laudo técnico ambiental
Consultar o zoneamento ecológico-econômico da região
Ter orientação jurídica especializada
Sem isso, a regularização fundiária pode resultar em indenizações, embargos ou perda parcial da área.
✅ Checklist do produtor em áreas com vegetação nativa
Verificação | Status |
Área inclui nascentes, margens de rio ou encostas? | 🔲 |
Possui CAR e informações ambientais atualizadas? | 🔲 |
Já consultou um advogado ambientalista ou agrarista? | 🔲 |
O pedido de usucapião contempla apenas área produtiva? | 🔲 |
Há documentação de manejo ou preservação? | 🔲 |
📢 Conclusão
O usucapião rural é um direito legítimo, mas não absoluto.Quando esbarra na preservação ambiental, ele precisa ser repensado, ajustado e, muitas vezes, limitado pelo dever de proteger o meio ambiente.
É possível conciliar os dois mundos — a justiça social no campo e a proteção da natureza —, desde que o produtor esteja bem informado, assessorado e amparado juridicamente.
🔍 Tem dúvidas sobre sua posse ou a situação ambiental da sua terra? Fale com um advogado especializado.
✍️ Sobre a autora
Dra. Mariella F. Maccari de Camargo é Sócia-Proprietária do Escritório de Advocacia Maccari de Camargo, especializado em Direito Ambiental, Agrário e do Agronegócio. É também Especialista em Direito do Agronegócio pela Fundação Escola Superior do Ministério Público de Mato Grosso - FESMP/MT (2021) e Membra da Comissão do Agronegócio, Comissão do Meio Ambiente e Comissão de Direito Fundiário da OAB/MT. Atua há mais de 8 anos defendendo o Produtor Rural, garantindo direitos e segurança jurídica para todo o ecossistema do agronegócio.








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